As lições de las vegas
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Em dado momento dos desagradáveis 90 minutos protagonizados por Brasil e Uruguai, uma pergunta começou a se impor: caso conseguisse a classificação, fosse nos pênaltis ou aproveitando a vantagem de um jogador a mais no segundo tempo, o que a seleção brasileira estaria colhendo para o futuro?
Seria possível falar numa injeção moral que o time precisa, dada a pressão acumulada pelos anos sem conquistas de um Mundial. Ou argumentar que ganhar a Copa América não seria algo a menosprezar, porque todo troféu tem sua importância. Por outro lado, ao avaliar o desempenho do Brasil nos quatro jogos, era difícil observar um time em evolução, uma base para sustentar o que há de mais importante no horizonte: a preparação para 2026.
É possível que, da próxima vez que se reunir, o time de Dorival Júnior exiba, fora de um ambiente tão tenso quanto o da partida de Las Vegas, o resultado do período que permaneceu treinando. Talvez a tensão competitiva tenha abafado as intenções táticas do time. O caso é que, após a eliminação nos pênaltis, a sensação é que se caminhou pouco.
Aqui é importante uma ponderação. Em toda derrota do Brasil, o nome do treinador ocupa as manchetes. E coube a Dorival a exposição pública e as explicações. O que, no fim, é confortável para quem fez a seleção chegar aos Estados Unidos como time embrionário. A absoluta falta de processos e projeto esportivo da CBF, que fez o Brasil ter três treinadores diferentes (dois deles interinos) desde o fim do Mundial do Catar, plantou a semente da eliminação precoce.
O jogo com o Uruguai foi curioso, porque reunia dois treinadores com discursos baseados na esportividade, na ética, no compromisso com o respeito ao jogo e ao público. É injusto afirmar que Dorival e Marcelo Bielsa traíram seus princípios. O que se pode dizer é que não foram capazes de fazer seus preceitos se sobreporem às emoções dos atletas. O jogo descambou para o terreno da brutalidade, em que os uruguaios, com suas 26 faltas, extrapolaram muitos limites. Do outro lado, o Brasil tampouco foi um time dócil.
A partida confirmou impressões de que esta seleção, negligenciada pela confederação, ainda esboça comportamentos e tem longo caminho para se tornar um time coeso. Contra o Uruguai, o traço mais assustador foi a dificuldade na saída de bola. Contra uma marcação homem a homem em quase todo o campo, o Brasil não encontrava meios de sair de sua defesa com passes limpos. Quase sempre, recorria a volantes, pontas ou meias recebendo de costas para o gol rival, numa dependência de soluções individuais. Havia poucos apoios ou movimentos para ludibriar a marcação.
Se o futebol brasileiro hoje concentra seus talentos em homens rápidos e habilidosos no ataque, repetiu-se a sensação de que o time tenta acioná-los a todo custo, sem trabalhar a bola para que os atacantes a recebam em vantagem. Há muita pressa e pouca pausa, seja pela falta de um coletivo mais trabalhado, ou pela escassez de meias que ditem o ritmo.
Com um jogador a mais na metade final do segundo tempo, um Brasil obrigado a construir contra um rival fechado produziu pouca coisa. O que faz olhar para o futuro e, desde já, deparar com duas incógnitas. Em que nível voltará Neymar? Lucas Paquetá será suspenso? Por quanto tempo?
Não são as únicas interrogações. É justo pensar se teremos melhores opções nas laterais e no meio-campo, ou como irão se desenvolver jovens como Endrick e Estevão. A única certeza é que todas as individualidades terão terreno mais propício para prosperarem se a seleção tiver um coletivo com melhor funcionamento.