Miércoles, 07 de Mayo de 2025

‘O brasil terá uma voz importante na eleição do papa’

BrasilO Globo, Brasil 5 de mayo de 2025

entrevista

entrevista
Em 2013, pouco depois que o então cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio foi escolhido como sucessor de Bento XVI, o embaixador brasileiro Everton Vieira Vargas assumiu o comando da Embaixada do Brasil em Buenos Aires. Anos depois, já no terceiro mandato de Lula, o diplomata foi enviado ao Vaticano, onde teve o privilégio de se encontrar e conversar em várias oportunidades com o Papa Francisco. O último encontro aconteceu poucos dias antes de sua internação, em fevereiro, durante uma visita da primeira-dama Janja a Roma.
" Senti que ele já estava muito debilitado " conta Vieira Vargas, que lembra do Papa como um homem sempre bem-humorado e carinhoso.
O futuro do Vaticano é uma incógnita, mas o embaixador, que conhece muito bem a Cúria Romana, assegura que qualquer retrocesso teria custos para o sucessor de Francisco e para a Igreja.
Sete cardeais brasileiros votarão no conclave para eleger o sucessor do Papa Francisco. Como o senhor avalia o peso do Brasil nessa decisão?
Primeiro, para colocar em contexto, é importante dizer que hoje o Brasil tem o maior episcopado do mundo, enquanto os Estados Unidos têm o maior clero. A Itália vem depois dos EUA. Até dois meses atrás, o Brasil tinha um prefeito de dicastério, que era o cardeal Dom João Braz de Avis, arcebispo emérito de Brasília [em 4 de janeiro de 2011, foi nomeado pelo Papa Bento XVI prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica, no Vaticano, cargo que exerceu até este ano]. Temos hoje um pré-prefeito, Dom Ilson de Jesus Montanari, do Dicastério para os Bispos. Ele é agora, inclusive, o vice-camerlengo [nomeado pelo Papa Francisco em maio de 2020]. Neste período de ausência do Papa, o camerlengo é quem se ocupa de todos os assuntos administrativos da Igreja.
O pontificado do Papa Francisco foi marcado por eventos de impacto para a Igreja e a Humanidade. A Igreja teve que enfrentar severa crise administrativa e financeira, além de responder ao clamor por medidas que coibissem e punissem casos de pedofilia. O mundo viveu a acentuação da secularização, a ascensão da extrema direita, a pandemia da Covid-19, a invasão da Ucrânia e a guerra entre Israel e o Hamas, tornando-se mais inseguro e violento. Francisco foi, com atos e palavras, o mensageiro da razão. Foi líder espiritual e estadista. Em meio a tudo isso, as relações entre Brasil e Vaticano ganharam grande impulso, com visitas e encontros entre o Papa e o presidente da República e visitas de alto nível de parte a parte.
Em 2013, Francisco contou com o apoio do Brasil?
Sim, ele [Francisco] era muito amigo de Dom Claudio Hummes [falecido em 2022, foi um cardeal brasileiro, frade franciscano e uma das principais lideranças da Igreja Católica no Brasil e no mundo]. Sabemos que ele teve papel importante na eleição do Papa, sendo amigo próximo de Jorge Bergoglio e influenciando a escolha do nome Francisco.
E qual é a posição do Brasil
no próximo conclave?
O Brasil, pelo tamanho do universo católico e pela reputação de sua Igreja, terá uma enorme capacidade de diálogo. O cardeal Jaime Spengler (arcebispo de Porto Alegre e presidente da CNBB) é também presidente do Conselho Episcopal Latino-americano (Celam), o que facilita o diálogo latino-americano sobre os temas que serão discutidos durante o conclave. A imagem da Igreja brasileira hoje é a de uma Igreja atuante, num país continental. Isso faz com que a voz do Brasil seja uma voz importante no conclave.
Não será fácil suceder
a Francisco, um Papa carismático, reformista, amado por muitos…
Francisco não mexeu, exceto no caso da pena de morte, na doutrina da Igreja. Outras mudanças diziam respeito a procedimentos. No caso dos homossexuais, por exemplo, ele não homologou o casamento gay. Ele reconheceu os gays como filhos de Deus. E, ao serem filhos de Deus, a Igreja não pode lhes negar a benção divina. Foi genuinamente revolucionário.
A pergunta que não quer calar: seu sucessor dará continuidade a essas reformas?
Não sabemos quem será o futuro Papa. Mas temos de pensar que a pessoa que for ocupar o trono de São Pedro vai, na mesma hora, lidar com pressões de todos os gêneros. Minha opinião pessoal é que, se a Igreja " se o futuro Papa " ingressar num caminho de recuo, isso terá um custo enorme junto aos fiéis e junto a setores relevantes da hierarquia da Igreja. As reformas do Papa buscaram arejar a vida da Igreja, e creio que isso concorreu para o aumento do número de fiéis. Uma pesquisa recente publicada no jornal oficial do Vaticano revelou que houve um aumento no número de católicos no mundo, perfazendo mais de 1,4 bilhão de fiéis.
Alguns especulam com a possibilidade de um Papa africano. Há chances?
A África é a região onde o catolicismo mais cresce, ao lado da Ásia. Mas, se olharmos para a África, veremos que muitos temas enfrentam resistências. O arcebispo de Kinshasa [capital da República Democrática do Congo], cardeal Fridolin Ambongo Besungu, esteve com o Papa no ano passado, e contou a ele " e isso é público " sobre as dificuldades dos bispos africanos para implementar as disposições da Santa Sé sobre a bênção aos gays, como previsto na exortação Apostólica Fidutia Suplicans.
Podemos inferir que um
Papa africano seria mais conservador?
Faz sentido.
Quais são suas lembranças dos encontros com Francisco?
Quando em 2015 participei de uma audiência geral no Vaticano e lhe disse que era o embaixador do Brasil na Argentina, ele respondeu: "O senhor mora na melhor casa de Buenos Aires." Foi muito engraçado. Era uma pessoa muito bem-humorada, positiva. Chegou até a fazer um encontro com humoristas, e alguns vieram do Brasil. Essa positividade era sua força para buscar estar com o povo, mesmo quando sua saúde já claudicava. Guardarei dele a lembrança de um homem de visão e, ao mesmo tempo, sensível às necessidades do homem comum. Francisco era um homem interessado na essência dos desafios. Mostrou na prática o que é o amor ao próximo. Era sempre muito carinhoso.
Everton Vieira Vargas /embaixador
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