Iof não deveria ser usado para arrecadação, dizem especialistas
desafio fiscal
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O aumento nas alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) proposto pelo governo federal criou uma crise com o Congresso e deixou o Ministério da Fazenda sob pressão de economistas e do mercado. Após recuar em um ponto específico " a cobrança sobre aplicações de fundos de investimento no exterior ", a Fazenda argumentou que não há como mudar os demais sob risco de não cumprir as regras fiscais.
Criado nos anos 1960, o objetivo principal do IOF é funcionar como um mecanismo de regulação econômica pelo governo, explicam especialistas. Com isso, calibrar a alíquota do tributo para elevar a arrecadação seria burlar a regra.
" O IOF é um imposto extrafiscal, ou seja, regulatório. É um tipo de imposto criado para ser instrumento de intervenção do Estado na economia " diz Hermano Barbosa, sócio tributarista do BMA Advogados. " É diferente do tributo fiscal, aquele usado para arrecadação de recursos para bancar a máquina pública.
Reação ao drible
Barbosa explica que a maior surpresa sobre o aumento da alíquota do IOF está nas razões apresentadas pelo governo:
" Isso não está sendo usado para fins extrafiscais, mas declaradamente para fins arrecadatórios. Tentou-se burlar as regras para ter uma solução mágica de arrecadação imediata.
Para Marcus Vinícius Gonçalves, sócio líder da área de tributos da KPMG Brasil, a forte reação do Congresso à alta do IOF tem a ver com esse drible na regra. Se a meta é ampliar arrecadação, a discussão deveria seguir o rito de aprovação de mudanças de tributos fiscais e que exige alteração da legislação.
No Brasil, os tributos federais só podem ser estabelecidos por lei, entrando em vigor após um prazo de 90 dias ou no início do ano seguinte, a depender do imposto. Além do IOF, ficam fora dessa regra os impostos sobre Produtos Industrializados (IPI), importação e exportação.
O IOF foi criado em 1966, substituindo um imposto sobre transferências para o exterior. A partir da Constituição de 1988, incorporou operações de crédito, seguros, títulos e valores mobiliários.
" Com a hiperinflação da época, era comum empresas e pessoas físicas fazerem movimentações diárias em operações financeiras como o overnight (transações de um dia para outro). E o IOF veio para tentar regular essas movimentações, olhando para uma questão de saúde econômica " diz Gonçalves.
Na prática, o tributo pode ser usado para controlar a quantidade de dólares entrando ou saindo do Brasil, estimular ou proteger um setor específico. Gonçalves explica que, se o governo quer tornar o crédito mais barato e injetar mais recurso na economia, ele reduz a alíquota; em um cenário de inflação, eleva.
Os especialistas afirmam ainda que não se pode comparar o decreto de aumento do IOF com a antiga CPMF. Conhecida como "imposto do cheque", porque incidia sobre todas as movimentações financeiras de contas-correntes, deveria valer por apenas dois anos " mas acabou vigorando de 1997 a 2007.
" Não dá para comparar com a CPMF. É diferente. Se fizesse um Pix, teria CPMF, mas não tem IOF " diz o contador Paulo Henrique Pêgas, professor do Ibmec.
Barbosa lembra que essa comparação não é nova:
" Quando a CPMF caiu, o IOF sobre o câmbio foi estabelecido em 0,38%, o que gerou uma certa percepção de "compensação". Mas são dois tributos bem diferentes. A CPMF incidia em lançamentos a débito em contas-correntes. E o IOF tem só quatro fatos geradores possíveis: câmbio, crédito, seguros e operações com títulos e valores mobiliários.
Já Gonçalves, da KPMG, diz entender a comparação, porque a medida do governo desvirtuou o propósito do IOF.
Já a incidência do IOF sobre as operações de risco sacado, muito usadas por varejistas, foi criticada pelas empresas. Elas argumentam que a antecipação de recebíveis não seria uma operação de crédito.
" Eu entendo que é financiamento. Se colocou banco no meio, tem IOF " diz Pêgas.