Sábado, 15 de Noviembre de 2025

Crédito aos correios requer maior aval já dado pelo tesouro a estatais

BrasilO Globo, Brasil 15 de noviembre de 2025

Em busca de R$ 10 bilhões para equilibrar suas contas, os Correios precisarão de um aval ...

Em busca de R$ 10 bilhões para equilibrar suas contas, os Correios precisarão de um aval inédito do Tesouro Nacional para concretizar a operação de crédito. Um levantamento do GLOBO mostra que o valor é mais que o dobro do maior empréstimo a uma estatal com garantia da União já autorizado pelo Tesouro até hoje, um crédito de R$ 4 bilhões do Banco do Brasil para a Eletrobras, em agosto de 2014, antes da privatização. Diante das dificuldades financeiras, a direção dos Correios já admite negociar uma taxa acima de 120% do CDI (Certificado de Depósito Interbancário), considerada o limite de custo normal nestes tipos de contratos com entes públicos.
Para compensar a taxa mais alta, a estatal negocia com os bancos um prazo mínimo de pagamentos de dez anos. A avaliação da cúpula da estatal é que esse é o tempo necessário para a empresa executar o plano de recuperação " com duração estimada em dois anos ", voltar a operar no azul e conseguir pagar o empréstimo. Conforme mostrou O GLOBO, a empresa corre contra o tempo para levantar os R$ 10 bilhões em 15 dias para regularizar dívidas atrasadas e a vencer nos próximos meses.
A necessidade de caixa da estatal chega a R$ 20 bilhões, mas diante do custo elevado do crédito cobrado por um grupo de grandes bancos para conceder o empréstimo, de 136% do CDI, a direção dos Correios recuou e agora negocia um valor mais baixo. Como houve demanda, a estatal optou por consultar cerca de dez instituições financeiras, incluindo bancos menores, e aguarda retorno até o fim do mês.
Privatização depois?
Com contratos em atraso, os serviços prestados pelos Correios têm sido afetados. A estatal tem dificuldades para reduzir o índice de atraso nas entregas, por exemplo, que está maior do que o desejado, o que impacta na obtenção de novos clientes. Além de regularizar as contas, o empréstimo é visto como necessário para custear o plano de demissão voluntária (PDV), que tem meta de desligamento de dez mil funcionários para economizar R$ 2 bilhões por ano.
O plano de reestruturação também abrange o fechamento de cerca de 700 agências e unidades logísticas. A ideia da estatal é identificar onde há sobreposição, ou seja, postos que ficam em locais próximos uns dos outros e que possam absorver a demanda.
A obtenção do empréstimo com prazo mais longo é a principal aposta da nova direção da empresa para dar uma resposta imediata sobre a crise nos Correios e inciar o plano de recuperação. Desde dezembro do ano passado, a estatal tem recorrido aos bancos para conseguir crédito, sem conseguir equilibrar as contas.
Até junho, os Correios registraram R$ 427 milhões de despesas com juros e multas, e mais R$ 74,6 milhões com encargos da dívida. O especialista em finanças Daniel Pecanka de Andrade, mestre em Administração pelo Insper e pela Nova School of Business and Economics, afirma ser mais factível a estratégia da nova direção dos Correios de buscar um empréstimo de menor valor. Para ele, uma dívida de R$ 20 bilhões, mesmo com 120% do CDI, teria enorme impacto nas contas da estatal.
" Estamos falando em mais de R$ 3,5 bilhões por ano, sem considerar amortização. Com 136% do CDI, o valor ficaria próximo de R$ 4 bilhões por ano " disse Pecanka, acrescentando: " Por isso, é mais saudável dividir o empréstimo, tomar R$ 10 bilhões a um custo mais baixo, e colocar a casa em ordem. Isso passa por tratar o recurso que vem deste empréstimo com parcimônia e conservadorismo, renegociar e regularizar os passivos atrasados e implementar as reduções de custo e ganhos de eficiência.
A exemplo dos Correios, a Eletrobras enfrentava dificuldades financeiras quando firmou o maior contrato com aval da União até hoje. Além dos R$ 4 bilhões com o Banco do Brasil, no mesmo mês a empresa obteve mais R$ 2,5 bilhões, da Caixa Econômica Federal. Um ano antes, em 2013, o BNDES também havia concedido à estatal um empréstimo de R$ 2,5 bilhões.
No total, os R$ 9 bilhões recebidos serviram para reforçar o capital de giro e viabilizar o plano de investimentos da companhia à época. A Eletrobras foi privatizada em 2022 e passou a se chamar Axia Energia.
Para especialistas, essa também pode acabar sendo a solução para os Correios. A estatal postal chegou a ser colocada no mesmo plano de desestatização no governo de Jair Bolsonaro que privatizou a Eletrobras, mas foi retirada na gestão Lula.
ceticismo quanto ao plano
O plano de reestruturação idealizado pela nova gestão dos Correios ainda inspira dúvidas sobre a sua eficácia para reerguer a empresa. Economistas e ex-integrantes do governo indicam ceticismo, por exemplo, na capacidade da empresa de voltar a dar lucro, considerando a forte competição com o setor privado e o fardo pesado de gastos dos Correios, que tem mais de 800 empregados com benefícios bastante generosos, como 70% de adicional de férias. Nesse cenário, o empréstimo pode ser inócuo.
Um caminho mencionado pelos especialistas seria tentar vender a vertente mais rentável dos Correios e enxugar a estrutura restante, que ficaria dependente do Tesouro Nacional para manter a universalização do serviço postal, obrigação constitucional da União.
Dentro da empresa, porém, a ideia é criar um ecossistema de novas receitas para não depender de aportes do governo. A mudança do controle para o setor privado tampouco é considerada uma solução pela empresa, uma vez que o entendimento é que é necessário ter um agente de logística estatal para entregar itens essenciais em todas as regiões do país.
Os Correios registraram um prejuízo acumulado de R$ 4,3 bilhões no primeiro semestre de 2025. Só no segundo trimestre, entre abril e junho, o resultado negativo atingiu R$ 2,6 bilhões, equivalente a cinco vezes o registrado em igual período do ano anterior, de R$ 553,1 milhões.
A economista Zeina Latif, sócia-diretora da Gibraltar Consulting e colunista do GLOBO, avalia que o empréstimo pleiteado pela nova direção dos Correios pode ser um desperdício se não houver mudança na lógica do modelo de negócio da empresa, que não se sustenta mais em um ambiente digital, em que a comunicação não depende mais de cartas, e com a concorrência no setor de entregas:
" Fazer esse socorro para não mudar nada não faz sentido econômico. Estaria se colocando mais dinheiro para o motivo equivocado.
Zeina reconhece que a privatização total deve ter baixa atratividade. A parte mais rentável, contudo, seria possível vender ou firmar uma parceria com o setor privado. O serviço deficitário de universalização postal ficaria em uma estrutura estatal menor, dependente do Tesouro Nacional.
" O setor privado vai ter interesse por uma parte. Os Correios virariam uma estatal dependente, com estrutura muito enxuta e papel restrito.
Para a economista e ex-diretora do BNDES Elena Landau, o plano de reestruturação não deve resolver a incapacidade da empresa de gerar receitas para se manter. Landau defende que uma solução seria enquadrar os Correios como estatal dependente, com aportes diretos do Tesouro, mas isso não está nos planos do governo.
" Para evitar essas ginásticas e deixar tudo mais claro, os Correios deveriam se tornar dependentes (do Tesouro). Está evidente que não tem mais capacidade de gerar recursos para se manter.
O economista Márcio Holland, professor da FGV e ex-secretário de Política Econômica da Fazenda, manifesta preocupação com a garantia da União à operação de crédito. Interlocutores da equipe econômica dizem, porém, que o aval formal depende da apresentação de um plano de reestruturação consistente.
" O que tem sido anunciado é uma redução um pouco das operações, e sombreamento de várias agências que poderiam ser integradas e PDV. Isso não resolverá o problema " diz Holland.
‘Reinvenção’
Roberto Troster, economista e sócio da Troster & Associados, avalia que o plano pode dar certo, se os Correios souberem se reinventar. Uma saída é usar sua capilaridade para oferecer novos serviços que agreguem valor.
" A rede nacional dos Correios é uma coisa muito boa. Pode atuar sendo um canal para ofertar outros serviços. Se for uma boa reinvenção, pode ter uma chance de dar certo. Só cortando custos, o empréstimo só estará postergando a hora da verdade, porque o modelo de negócios atual é obsoleto.
La Nación Argentina O Globo Brasil El Mercurio Chile
El Tiempo Colombia La Nación Costa Rica La Prensa Gráfica El Salvador
El Universal México El Comercio Perú El Nuevo Dia Puerto Rico
Listin Diario República
Dominicana
El País Uruguay El Nacional Venezuela