Encerrar um jogo por ofensas será um marco contra o racismo. mas falta respaldo
triste rotina
triste rotina
Desde julho do ano passado, o Código Disciplinar da Fifa permite que os árbitros até encerrem uma partida em caso de atos racistas reincidentes durante o jogo. Tal medida, no entanto, ainda não chegou a ser aplicada no futebol mundial e nenhum clube perdeu os pontos. A rotina continua sendo cenas como a do malinês Marega, do Porto, na rodada de domingo do Campeonato Português.
Inconformado, o atacante pediu substituição após ser alvo de cânticos racistas por parte dos torcedores do Vitória de Guimarães, clube que já defendeu, no Campeonato Português. Após alguns companheiros tentarem contê-lo, ele deixou o campo e ainda levou um cartão amarelo por gestos obscenos à torcida adversária " a punição está sendo revista. O confronto continuou com vitória do Porto.
A postura da arbitragem é vista dentro de um contexto maior cuja finalidade é sempre preservar o espetáculo vendido. Quem já sofreu o racismo em campo, como jogador ou árbitro, afirma que será um marco na luta contra o racismo o dia em que uma partida for realmente encerrada e todos os envolvidos deixarem o gramado. Atualmente, há três passos: interrupção até que as injúrias cessem; paralisação do jogo em caso de reincidência e encerramento se a situação não for resolvida.
" Só houve mudança na teoria. Na prática, não tem acontecido. Falta mais rigor, é necessário mais respaldo e apoio das entidades à arbitragem. Os árbitros se sentem fragilizados, pensam na carreira, em retaliações. Poderia ser criado um comitê nos jogos para que a decisão fosse compartilhada " disse o ex-árbitro e comentarista da Rede Globo, Paulo César Oliveira, destacando que a falta de negros no comando do futebol dificulta mudanças mais profundas.
O comentarista, porém, não retira toda a responsabilidade do árbitro. No caso das punições aos jogadores ofendidos " além de Marega, Taison foi expulso em jogo do seu time Shakhtar Donetsk contra o Dinamo de Kiev por responder às ofensas raciais ", o bom senso deve prevalecer:
" Pela regra fria ele tem que punir o jogador. Mas se não tivesse cumprido a regra seria elogiado. Ele tem poder para agir com bom senso para não beneficiar os infratores.
A tentativa dos companheiros de impedir Marega de sair do campo também faz parte do contexto do futebol que se acostumou a aceitar ofensas e xingamentos como parte do esporte, segundo o ex-jogador Grafite. Marega, em suas redes sociais, defendeu os companheiros que tentaram acalmá-lo, como o zagueiro Alex Telles.
" A grande maioria ali não era negro. Eles nunca sentiram aquilo na pele e tentaram contornar a situação. Talvez para não prejudicar o clube. Alguns negros olharam apenas e ficaram sem ação. A grande atitude seria todos saírem juntos do campo " afirmou Grafite, que, em 2005, reagiu com um tapa em Desábato, do Quilmes, ao ser ofendido numa partida do São Paulo pela Libertadores.
Naturalizado russo, o atacante Ari, do Krasnodar, teve sua convocação à seleção local, ano passado, contestada por um jogador por ser negro.
" Em campo, nunca revidei. Cada um tem uma reação. Mas quando algo maior acontecer, como o jogo cancelado, isso realmente pode melhorar e ajudar que não haja mais isso no mundo.