Viernes, 26 de Abril de 2024

‘Eu vou ser resultadista e ponto. quero ganhar’

BrasilO Globo, Brasil 15 de enero de 2021

Entrevista

Entrevista
Você provavelmente conhece bem o jogador Filipe Luís. Mas, por trás do lateral-esquerdo do Flamengo, existe um treinador em formação. Nesta entrevista ao GLOBO, feita dias antes da virada do ano, o "Filipe Luís técnico" revela detalhes de sua preparação, comenta a relação com seus ex-treinadores e expõe as convicções e as dúvidas que ainda carrega.
A carreira como jogador tem recompensas: a conquista, o estádio lotado, a aclamação do público. Que prazer busca como técnico?
Quando começamos a jogar, é muita pressão. Mas, com 28, 29 anos, percebi que amo essa vida. Quanto mais delicada a situação, mais eu me sentia vivo. Depois, com 31 ou 32, tive as lesões. Estava triste e já sentia a vontade de ser treinador. Eu analisava jogos com o (ex-meia português) Tiago, no Atlético de Madrid. Pensávamos o que faríamos se fôssemos técnicos em determinado jogo. Quando voltei a jogar, fiz um pênalti e perdemos de 1 a 0. Estava no chuveiro, triste. Mas logo pensei: estou vivo, é a melhor coisa do mundo, estou onde queria estar. Preciso estar no campo. Tem outra coisa: quando o treinador vai dar preleção, falar como a gente vai pressionar, se colocar no campo, percebo "hoje não vai dar certo" ou "hoje senti firmeza". E costumo acertar.
Como executar, por vezes, um plano no qual não acredita?
Jorge Jesus tomava decisões táticas com as quais eu não concordava. Mas não é que ele estivesse certo e eu, errado: não tem isso no futebol. Existe o que funciona. Mas a minha função como jogador era fazer o que ele pedia. Quando acabava o jogo, e costumava dar certo, eu perguntava aos analistas por que foi feito assim, se não era melhor fazer da forma que eu imaginava.
Quando isso aconteceu?
A gente jogou com o Santos do Sampaoli no Maracanã, e foi o jogo mais difícil para nós. Eles tiveram a bola, dominaram, mas ganhamos de 1 a 0. Eu não concordei, porque, na preleção, ele (Jesus) falou: ‘Hoje, nós não vamos jogar, vamos lançar bola longa no Bruno Henrique’. A gente estava voando. Por que não confiar na gente? Mas fizemos tudo o que ele pediu. Fui conversar com os analistas, perguntar se não poderíamos ter vencido mais facilmente, e eles responderam que o Santos era o time que mais tinha feito gols com roubadas de bola no último terço do campo. Viu? Tem coisas que eu ainda não controlo.
Você trabalhou com Simeone, Mourinho, Jesus... são muito diferentes. Suas influências na formação como treinador são os que o dirigiram?
É uma mistura de todos os treinadores que tive. Simeone é perfeito na parte defensiva, praticamente anula as chances de gol do adversário. Ele vai tomar gol, claro, mas as chances são poucas. Aí conheci o Tite, com uma abordagem diferente, completa. O Jorge Jesus tem coisas que o Tite não tem, mas em alguns pontos são parecidos. Aí vem o Rogério (Ceni) com coisas que os dois não têm. Fui pegando um pouco de cada.
Que futebol você gostaria que seu time jogasse?
Digamos que eu comece a treinar o Figueirense, clube que me revelou e é do meu coração também. Proponho o jogo num 4-3-3 com saída sustentada com o goleiro? Ou vou para um jogo mais direto? Tenho que adaptar meu estilo aos jogadores. É necessário, com o time lá embaixo, arriscar uma saída de bola? Vão dizer: ‘Mas você não tem uma ideia de jogo definida, só dá balão, é retranqueiro…’ Eu vou ser resultadista e ponto. Quero ganhar. Se com aqueles jogadores essa forma de jogar vai me colocar mais perto da vitória, então tenho que fazê-los acreditar nisso. Agora, num time grande, é obrigação jogar, ser mais completo e se adaptar aos jogadores e ao adversário.
Que treinadores te deram maior abertura para discutir planos de jogo?
Até hoje, Simeone. O Rogério é bem aberto também. A gente nunca tenta opinar e sim entender o que o treinador quer passar. O Simeone dizia: ‘Vamos marcar assim’. E a gente pedia para ele explicar por quê. Cada jogo era uma ideia. Jorge não dava muita abertura, porque jogava igual independentemente do adversário. O Dome explicava muito, o Rogério dá bastante informação. O Mourinho joga sempre do mesmo jeito, então dificilmente dava abertura.
Até que ponto o treinador deve fazer concessões pela opinião dos jogadores?
O treinador tem que escutar os jogadores, mas colocar em campo a ideia dele. Ele está ali para convencer o jogador. Porque, mesmo que a ideia seja errada, se os jogadores acreditarem nela, pode dar certo.
Deu tempo de extrair alguma coisa do trabalho do Dome?
Dá para ver o Guardiola noDome. Ele fala muito do Messi, sabe muito de bola. Ele veio na hora errada. Qualquer um que viesse depois do Jesus seria na hora errada. A única coisa que senti falta era de um esquema dele. Mas ele tinha uma saída de jogo excelente, pressão no adversário excelente, ele é muito bom, mas veio na hora errada. Pegou lesões, Covid-19...
E o Ceni?
Mais do que paizão, é um amigão da gente. O Rogério é o que mais parecido joga com o Jorge Jesus. O 4-4-2, muito completo. Ele vive o futebol 24h por dia. Entende muito mais de jogo do que quando estava no São Paulo. Tem potencial para chegar à seleção.
Você se imagina mais elétrico ou contido à beira do campo?
Não posso ser passivo, tem que ter cobrança. Mas se você me vê jogando, não é meu estilo. Por isso, quero começar em uma categoria de base para errar, ver, perceber se tenho condições totais de ser treinador. Muitas coisas que a gente imagina de um jeito vão ser de outro. Não quero errar no profissional. Atlético de Madrid e Flamengo ofereceram me apoiar no início. Imagina começar no Flamengo e errando no profissional? (risos)
Você cataloga treinos para aplicar no futuro?
Tenho muitos treinos anotados. Do Mourinho, do Jesus... Do Simeone, tenho na cabeça. Do Rogério, é impossível, porque o leque é infinito. Os do Mourinho foram os melhores até agora. Eram dinâmicos, intensos. Os do Jesus eram simples, quase sempre a mesma coisa, mas abriam a cabeça. O Simeone treinava de acordo com o adversário. Passei por tudo. O que vou fazer? (risos) Vai ser em função da necessidade da equipe. A defesa, para mim, precisa ter muito mais treino que o ataque. Um time que não toma gol é um time que ganha título. Mas claro que a construção de jogo vai acontecer durante a semana...
Que experiências ruins teve e não repetiria como treinador?
Passar dúvidas para a equipe. Durante a semana, mudar três, quatro vezes o sistema, a escalação, passar insegurança. Se o treinador estiver com dúvida, os jogadores vão ter dúvidas. O jogador percebe tudo o que o treinador está pensando.
Que time tem prazer de ver?
O Barcelona está chato de assistir (risos). O Liverpool e o Atlético de Madrid, tenho prazer de ver. Não gosto de ver o São Paulo jogar, porque é tão anárquico e dá certo. É questão de gosto pessoal. É uma posse de bola muitas vezes passiva, mas eles têm muito mérito. O último que me agradou ver foi o Flamengo de Jorge Jesus. O Flamengo é o time que mais se assemelha àquele Bayern campeão da Champions.
Filipe Luís/ JOGADOR DO FLAMENGO
na web
TITE, ATRASO TÁTICOE MAIS: Leia a íntegra da entrevista no site.
Filipe Luís/ JOGADOR DO FLAMENGO
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