Sábado, 04 de Mayo de 2024

‘Busque bons mentores e tenha um plano de carreira’

BrasilO Globo, Brasil 25 de abril de 2024

PALAVRA DE CEO

PALAVRA DE CEO
Ter a orientação de bons mentores e traçar um plano de carreira " mapeando habilidades necessárias para alcançar objetivos profissionais " são prioridade para ingressar e crescer no mercado de trabalho, segundo Maurício Rodrigues, à frente da operação da Bayer Crop Science para a América Latina, a divisão agrícola da multinacional.
Há 25 anos atuando no setor do agronegócio, em grande parte no exterior, o executivo é o último entrevistado da série Palavra de CEO, que integra o projeto Tem Que Ler, de conteúdos exclusivos para assinantes do GLOBO. Ela mostra como líderes de companhias de variados portes, perfis e vocação enxergam o profissional do futuro.
Aos 49 anos, Rodrigues frisa que a maturidade profissional estimula a atuação com foco no trabalho em equipe, ante um desempenho individual mais competitivo. Engenheiro civil pós-graduado em finanças e controladoria, ele sublinha que "não dá para ficar só no básico" para promover diversidade e inclusão nas empresas: é preciso traçar metas e adotar ações para acelerar o processo.
E cita a forma como desafios ligados à temática racial impactaram sua jornada profissional, em vídeo incluído na versão digital desta entrevista. Nele, o executivo ensina ainda como insucessos podem ser ponte para conquistas maiores na carreira.
Contratação irresistível
"Pessoas que saibam trabalhar de maneira colaborativa e efetiva." Entre as qualidades muito importantes de um profissional, a primeira é ter vontade de aprender e seguir aprendendo. Segundo, ter um senso de empatia muito grande. Ou seja, gente que consegue se colocar no lugar dos outros. E, por último, sendo bem objetivo, pessoas que saibam trabalhar de maneira colaborativa e efetiva.
Crescimento profissional
"Ter interesse em tudo, aprender o máximo possível, não se limitar a nada." Para quem está no início de carreira, é preciso ter a percepção de que todo e qualquer aprendizado é bem-vindo. Você ainda está norteando sua carreira e deveria ter interesse em tudo, procurar aprender o máximo possível, não se limitar a nada. Outro ponto seria buscar bons mentores, e não tem uma forma muito clara de fazer isso porque são pessoas às vezes próximas, com uma experiência específica, mas que possam te ajudar a nortear sua carreira. E algo que me auxiliou muito é ter um bom plano de desenvolvimento individual, que não é necessariamente para os próximos 30 anos de carreira. Mas ter algo concreto do que eu tenho como objetivo, o que eu busco nos próximos anos, que tipo de experiências quero e que tipo de habilidades preciso desenvolver.
Time de sucesso
"É preciso ter gente que gosta de trabalhar em time, de colaborar." Criar um grupo que tenha características bem diversas, que possam te dar perspectivas distintas e ser complementares. Se a gente tem um grupo muito uniforme, de formas de pensamento unitárias, não se tem essa amplitude, e vai haver mais complexidade para inovar e lidar com problemas diversos. É preciso também ter gente que gosta de trabalhar em time, de colaborar. É como se constrói um time que gosta de se ajudar, em que o bem do grupo seja primordial, versus o individual. É um ponto difícil. E o básico é buscar pessoas com boa qualidade e alinhadas aos valores da empresa. Há uma questão geracional importante. Muitos de nós, e eu me incluo nisso, fomos formados num grupo competitivo e, às vezes, num processo muito individual. Talvez, no início da carreira, tenha-se essa sede de crescimento, interesse nessa competição. Mas eu acredito que, com a maturidade, você precisa cada vez mais se tornar esse profissional que consiga interagir, entender que o ganho de trabalhar bem é sempre muito maior do que ter gênios individuais trabalhando.
Diversidade
"Em determinados momentos, precisa tomar ações mais corajosas para acelerar." Primeiro, reconhecer que é uma jornada. Não é algo do dia para noite, mas (que pede) trabalhar num processo sério e forte de letramento, de educação. E reconhecer nosso desconhecimento muito grande, às vezes de vários desses temas. Reconhecer isso como grupo. E também como que a gente trabalha nos famosos vieses inconscientes. É importante e é fundamental haver um interesse genuíno. Eu focaria na questão da intencionalidade. Em determinados momentos, você precisa tomar ações mais corajosas, mais ousadas para acelerar (o processo), e não viver com o fato de que, já que é uma jornada, vamos andar bem pouquinho todos os anos só para dizer que estamos avançando. É contratar pessoas, dar exemplos. Muitas vezes, isso precisa vir do topo da organização. Metas, sem dúvida, ajudam. E mais importante que a meta são ações. Um dos primeiros programas para trainees (negros) no mercado foi o nosso, lançado na mesma época do Magalu (em 2020). Um programa específico para as pessoas negras, de forma a acelerar de maneira mais efetiva a formação de líderes dentro da empresa. Precisa ter a intenção porque você vai lidar com dilema, questionamento. Lançamos um segundo em 2022. Não é um processo perfeito, mas não dá para ficar trabalhando só no básico. Em algum momento, precisa acelerar, tomar medidas mais fortes para tentar conseguir objetivos de maneira mais efetiva e mais rápido.
Trajetória pessoal
"Qualquer pessoa negra, todos os dias, parece estar se provando para dizer por que está em uma função." Eu tive uma vantagem que foi ter pais que quebraram um ciclo nesse processo natural de pessoas negras, por terem se graduado numa universidade, que me permitiram, de alguma maneira, oportunidade de estudar numa boa escola, entrar numa boa universidade, que nos anos 1990 nos abriam muitas portas para começar uma carreira, pelo menos lutando de igual para igual. Então, tive essa vantagem versus uma pessoa da média da população negra dentro do país que não tem a referência, acesso ao estudo e ninguém estimulando para acreditar que é possível. Eu tive essas três coisas. Por outro lado, isso não fez com que o preconceito não existisse. Ele existe diariamente, seja em microagressões diárias, desde você entrar num prédio e ser tratado de forma diferente, entrar numa reunião e alguém nunca pressupor que você possa ser o líder, alguém que agregue, a ser o único na universidade, na escola, no trabalho, de uma forma geral. No meu caso, talvez essa boa base, esse acesso que eu tive e essa pele grossa que você vai criando me permitiram conseguir sobreviver a isso. Mas qualquer pessoa negra convive e lida com o fato de que, todos os dias, parece que está se provando, e mais do que a média das pessoas, para dizer por que está em determinada função, por que você merece estar ali. Isso faz com que você tenha de ter uma preparação emocional e de competição maior do que a média, porque você está sempre provando que tem condições de fazer uma atividade.
Trabalho e vida pessoal
"Quanto mais estabilizado na saúde, no pessoal, mais eficiente vai ser como profissional." Eu acho que dá para conciliar. Na verdade, precisa dar porque, tendo uma vida pessoal bem estabilizada, o reflexo na sua vida profissional é muito grande. Eu valorizo isso bastante. Não significa que não vão existir momentos em que se tenha de dedicar mais tempo ao trabalho, há crises, situações mais extremas, complexas. Eu valorizo e priorizo a minha vida pessoal, os momentos que eu tenho de relaxamento, com a minha família, a minha esposa, as viagens, poder sair com meus amigos e tomar um chope no fim do dia, praticar esportes. Eu acho que essa composição de vida pessoal era muito subestimada há 20, 30 anos. Hoje está claro que você precisa valorizar esse lado para ter uma vida pessoal bem estabilizada. Quanto mais estabilizado do ponto de vista de saúde, das suas relações, mais efetivo e eficiente você vai ser como profissional, e mais feliz. Eu fiz aulas de violão na pandemia. Nunca vi pessoalmente meu professor. Fizemos muito tempo de aula e me ajudou muito a aprender algo totalmente novo com 40 e poucos anos de idade. Achei fantástico. Aquilo me ajudou a relaxar, a atuar de maneira mais efetiva no meu dia a dia. O violão é um dos meus hobbies. Mas gosto de correr, de esquiar e, mais do que qualquer coisa, de viajar.
Como lidar com crises
"Olhar a situação em perspectiva ajuda a diminuir o estresse." A tendência natural é acreditar que é a pior situação do mundo. Ao se distanciar um pouco e olhar em perspectiva, correlacionar com vivências anteriores, entender a magnitude de um problema em comparação a outras situações, que ferramenta se tem para enfrentar aquela situação, isso ajuda a diminuir o estresse, essa preocupação extrema. Isso é bonito falado, mas às vezes não é tão fácil de colocar em prática. Quando você passa por uma crise, vai ter que puxar mais recursos, buscar mais mentes para tentar solucionar um problema. E vem a questão da colaboração. Num primeiro momento, você não reage, escuta. Tenta formular soluções, encarar aquilo de forma mais estruturada, e não reagir de forma muito intensiva. Evidentemente, tem crises e crises. Se estiver pegando fogo em alguma coisa, precisa reagir de maneira intensa. E se preparar para as crises. Muitas vezes, a experiência e a preparação para viver momentos de volatilidade te ajudam a encarar aquilo de uma maneira muito mais tranquila. Se tem algo que a maturidade e a experiência trazem é conseguir aprender a lidar com isso, não perder o seu sono, o que acontece acontece às vezes, mas não ajuda. Gera mais desgaste, mais cansaço.
Competividade
"Se tem uma startup fazendo melhor, como a gente colabora junto?" É importante entender seus concorrentes, como podem se relacionar ao seu dia a dia, a sua estratégia de negócio, e pode-se aprender muita coisa. Esse fator é fundamental. Mas também não se pode ficar copiando tudo que o concorrente faça. Senão, você não consegue se diferenciar. Aí vem a inovação. O conceito de concorrência nos últimos anos vem se ampliando, porque tem os concorrentes tradicionais, que se parecem, se assemelham muito a sua empresa, e tem essas startups, empresas com nível de criatividade, de agilidade tão grande que te permitem crescer de maneira mais forte. O que fazemos é aprender com esses ditos competidores. Se tem alguém fazendo algo melhor, com uma expertise muito mais forte, como a gente colabora junto, cria valor junto, mais do que ficar o tempo inteiro de forma antagônica? Daí vem um pouco esse conceito de inovação aberta.
Saúde mental
"É impossível não misturar vida pessoal com o trabalho. Você não se divide como um ser humano."
Eu não considero que seja positivo estar sempre sob uma pressão de ter de performar melhor do que os outros (no caso dos profissionais negros). Por muitos anos, eu tratei isso como normal, porque era a realidade em que eu estava. Como é que você se prepara para esse tipo de desafio? Por muitos anos, não se falou em saúde mental. Eu provavelmente lidei com muitos problemas sem saber. E, sem dúvida, isso deixa resquícios. Talvez, a gente nem pudesse acessar um psicólogo por muito tempo, existia uma série de preconceitos, de desinformações sobre o assunto.
A pandemia trouxe bastante luz à questão da saúde mental. Na empresa, tem vários canais, psicólogos e uma série de coisas para dar respaldo às pessoas de uma maneira mais efetiva. Mas também tem o papel individual de cada pessoa estar mais atenta.
Há mais de 20 anos, as pessoas falavam uma coisa, que hoje está provado ser uma falácia, de que não se pode misturar vida pessoal com o trabalho. É impossível não misturar, você não se divide como ser humano. Tem situações em que você tem de conseguir falar sobre aquilo, pedir ajuda, ter gente que se preocupe genuinamente.
Maurício Rodrigues / CEO da bayer crop science américa latina
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