Republicano está de volta à casa branca: prepare seu bolso
Ao reassumir a presidência dos EUA hoje, Donald Trump traz o risco de mais inflação no ...
Ao reassumir a presidência dos EUA hoje, Donald Trump traz o risco de mais inflação no país. É praticamente consenso que suas propostas, se colocadas em prática, farão o Federal Reserve (Fed, o banco central americano), no melhor dos casos, reduzir o ciclo de cortes de juros. Então, desde já, são bem-vindas algumas adaptações na carteira de investidores com aplicações expostas ao mercado americano.
Uma das promessas de Trump é sobretaxar importados, especialmente da China. Mas o efeito inflacionário nos EUA pode ser pontual.
" Um produto chinês que custava US$ 10 pode passar para US$ 15, mas, no ano seguinte, não necessariamente passa a US$ 20 " explica William Castro Alves, estrategista-chefe da Avenue.
Outra medida diz respeito à imigração. Trump promete deportações em massa, o que levaria a uma redução significativa da mão de obra. Com escassez de trabalhadores, as empresas tendem a aumentar os salários para segurar bons profissionais " outro fator de pressão sobre a inflação.
Larissa Frias, planejadora financeira do C6 Bank, prefere ver para crer. Ela destaca que já existe uma política de deportação em curso, e não necessariamente será de fato turbinada. Outra proposta de Trump que acende o alerta para os juros é cortar impostos do setor produtivo. A trajetória do endividamento público americano já é considerada explosiva. Com menos receitas, o rombo fiscal pode aumentar. Diante disso, investidores exigiriam juros mais altos em troca dos títulos do Tesouro americano.
O Fed já deixou claro que o novo governo entrou na conta da política monetária. Foi uma das razões pelas quais a maior parte de seus diretores passou a prever só dois cortes de juros este ano em vez de quatro. Nesse cenário, rendimentos dos títulos de renda fixa americanos ficam mais atraentes. É preciso ter em mente que, apesar dos recentes cortes, os juros nos EUA ainda estão em níveis historicamente altos. Ou seja, além de serem considerados os ativos mais seguros do mundo, títulos americanos estão rentáveis como poucas vezes estiveram. E podem se manter assim por mais tempo que o previsto. Essa perspectiva já foi incorporada no preço dos papéis. Depois da vitória trumpista, os rendimentos dos títulos com prazo de dez anos entraram num rali.
" Papéis com prazo de dez anos estão com um retorno próximo de 5% " diz Castro Alves. " É interessante para o investidor brasileiro, que vai ganhar a variação do dólar quando trouxer o dinheiro de volta ao Brasil, mais esses 5%.
Paula Zogbi, gerente de análises da Nomad, alerta para um risco: o de não apenas haver menos cortes de juros, mas começar um ciclo de alta. Se os títulos passarem a incorporar esse cenário, quem se desfizer deles antes do prazo de vencimento perde dinheiro. O valor de face dos papéis tem relação oposta ao das taxas. Se um sobe o outro cai, e vice-versa.
Para Frias, do C6, além do Tesouro americano, títulos de crédito privado merecem ser olhados com carinho. Mas deve-se optar por empresas com carimbo de boas pagadoras (investment grade) das agências de classificação de risco.
No embalo das ações
Esse rali de taxas, no entanto, não se limita aos EUA: deve contagiar outros países, incluindo o Brasil. Os investidores retiram dólares de mercados emergentes para aplicar nos títulos americanos. Essa fuga de dólares tende a elevar a taxa de câmbio no Brasil, desvalorizando o real, o que pressiona a inflação " e o Banco Central terá de aumentar a Selic, a nossa taxa básica de juros, hoje em 12,25% ao ano. Em resumo, a renda fixa brasileira deve ganhar ou, ao menos, manter a atratividade atual.
" Reduzimos a alocação em ativos de risco no Brasil. Hoje, olhamos mais para títulos que acompanhem a Selic, e em um prazo maior aos indexados pela inflação " afirma Frias.
O passado não garante o futuro, mas vale lembrar que, entre 2017 e 2021, pegando o primeiro governo Trump, o S&P 500, índice com as 500 principais ações negociadas em Nova York, subiu 68% (com um solavanco em 2020, por causa da pandemia). Já no ano passado, o S&P 500 colecionou 57 recordes, e analistas acham que esse ritmo deve se manter. Castro Alves, da Avenue, trabalha com crescimento médio de 15% das principais empresas listadas nos EUA neste ano, com as de tecnologia à frente.
Nesse embalo, o S&P 500 subiria de 10% a 12% em 2025. Quase o triplo, portanto, da taxa básica de juros do Fed, hoje entre 4,25% e 4,5% ao ano. Mas essa estimativa para a Bolsa é uma média. Ou seja, para algumas empresas, especialmente as favorecidas pelas políticas de Trump, os ganhos podem ser ainda maiores.
" Trump falou muito em afrouxar leis ambientais e melhorar infraestrutura, o que favorece o setor de energia " diz Isabela Bessa, especialista em investimentos internacionais da Warren. " O setor financeiro também se favorece com menos regulação. E, na tecnologia, ele propõe impostos mais baixos e incentivos à competitividade.
Por outro lado, Zogbi, da Nomad, recomenda atenção com as empresas mais endividadas, pois juros altos podem comprometer seus resultados:
" Nesse cenário, faz sentido olhar mais para companhias já líderes em seus setores, boas pagadoras de dividendos.
Independentemente da ação escolhida, terá mais vantagens quem investir diretamente na Bolsa americana, pelas corretoras que oferecem o serviço no Brasil. Quem escolhe BDRs (recibos de ações americanas listados na Bolsa de São Paulo, a B3), diz Bessa, da Warren, sai perdendo:
" BDRs têm taxa, dão menos rentabilidade. Fora que o universo de ações por esse canal é mais limitado. O ideal é ir comprando aos poucos lá fora, para fazer um preço médio no câmbio.
No Brasil, por motivos locais, com destaque para a questão fiscal, a renda fixa vem minando o apetite por ações. Se a inflação nos EUA contribuir para manter a Selic nas alturas, haverá menos motivos ainda para a nossa Bolsa. Mas há oportunidades para os mais corajosos. O câmbio elevado (o dólar parece não querer deixar o patamar de R$ 6) favorece ações de exportadoras.
Criptogoverno
As criptomoedas são queridinhas de Trump, que chegou a defender a criação de uma reserva de Bitcoin pelo governo americano. Não por acaso, a mais famosa das criptos vem de um 2024 histórico, e sua cotação passou de US$ 100 mil. A confirmação de Paul Atkins para comandar a SEC, "xerife" do mercado americano, um entusiasta das criptos, ajudou.
" A regulação sob Trump tende a facilitar negociação e custódia desses ativos, então a demanda deve aumentar, especialmente se ele levar adiante o plano de reserva nacional em criptoativos " diz Zogbi.