Lunes, 07 de Julio de 2025

Responsabilização sem apoio é ineficaz

BrasilO Globo, Brasil 21 de abril de 2025

Ricardo Henriques

Ricardo Henriques
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), anunciou, há duas semanas, a criação da comissão especial responsável pelo projeto do novo Plano Nacional de Educação (PNE). Com isso, a partir de agora, os debates no legislativo e na sociedade sobre as metas para os próximos dez anos no setor se intensificarão. Na vigência dos dois últimos planos, evoluímos em vários indicadores, mas não na velocidade necessária, diagnóstico que nos força a refletir sobre como aprimorar metas e mecanismos de monitoramento e indução. Conforme revelou uma reportagem do GLOBO neste mês, uma das ideias defendidas por parlamentares de distintas correntes é o estabelecimento de medidas de responsabilização de gestores públicos em caso de não cumprimento das metas, mecanismo ausente nos dois PNEs anteriores.
Não seria correto dizer que o atual PNE fracassou por completo, pois ele de fato mobilizou a sociedade civil no campo educacional e serviu de parâmetro para o monitoramento e a ação dos órgãos de controle. Mas não foi suficiente, e a ausência de mecanismos mais duros de cobrança foi, na visão dos defensores da responsabilização, um dos motivos para isso.
A ideia de que gestores públicos se engajarão mais nos esforços pactuados caso saibam que o não cumprimento de metas terá consequências sobre eles soa intuitiva, mas não é simples. Em estudo publicado em 2016, o pesquisador Aries A. Arugay fez uma revisão da literatura acadêmica sobre mecanismos de responsabilização democrática nas áreas de saúde, educação e saneamento.
O autor analisa três formatos distintos, mas que podem ser sobrepostos: sanções, incentivos e a qualificação da cidadania. Os dois primeiros são mais conhecidos, têm suas limitações e potenciais, mas nenhum é claramente superior, e sua eficácia depende muito do contexto. Além disso, no caso de saúde e educação, são especialmente mais complexos. Ele destaca, porém, que estratégias de qualificação da cidadania têm se mostrado mais promissoras, pelo entendimento de que serviços públicos de qualidade não são privilégios de alguns, mas, sim, direitos a serem reivindicados de forma organizada pela população, levando a uma cidadania mais assertiva e ativa.
No caso específico da educação, um primeiro fato a ser reconhecido é que o acesso, permanência e aprendizagem dos alunos " três objetivos centrais de qualquer sistema educacional " sofrem impacto significativo de fatores externos à escola. Apenas para ficar num exemplo, os principais motivos declarados por jovens que abandonaram a escola antes de completar o ensino médio são a necessidade de trabalhar e, no caso das meninas, gravidez precoce e afazeres domésticos. Se a situação econômica do país ou de uma região se deteriorar, portanto, isso tende a afetar os resultados em sala de aula, mesmo que as políticas educacionais estejam alinhadas ao plano e sendo bem implementadas.
Outro fator que torna complexa a atribuição de responsabilidades individuais por metas não alcançadas é que resultados sustentáveis no campo educacional, em geral, demandam um tempo maior do que o de um mandato. Os frutos mais duradouros " positivos ou negativos " do trabalho de uma gestão podem aparecer apenas depois que seus responsáveis não estejam mais no cargo.
A dimensão mais importante a ser considerada neste debate, porém, é a garantia de condições adequadas para que os agentes públicos realizem aquilo que deles esperamos. Num sistema com 5.570 municípios e 27 unidades da federação que dividem responsabilidades entre si e com a União, é fundamental que tenhamos estruturas adequadas de apoio e colaboração entre os entes federativos. Essa é uma agenda que pode avançar por meio de outro projeto de lei no Congresso: o Sistema Nacional de Educação. Pressão sem apoio é inútil ou tende a gerar apenas comportamento disfuncional.
Se formos mesmo caminhar no sentido de alguma responsabilização, portanto, será preciso definir bem o que se espera dos gestores do sistema, pois só faz sentido cobrar algo que esteja na sua alçada, que seja factível, e garantindo que esses atores tenham as condições adequadas para a realização de seu trabalho.
Todas essas ponderações visam qualificar o debate. Reconhecer que resultados educacionais dependem de uma cadeia complexa de fatores não significa que agentes públicos não possam ser cobrados a realizar seu trabalho da forma mais eficiente e eficaz possível. Mas é fundamental entender que o salto que almejamos na educação requer a estruturação de um Sistema Nacional de Educação e, sobretudo, a corresponsabilização e o comprometimento de todos.
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