Inadimplência do novo consignado para clt surpreende bancos
O atraso no pagamento dos empréstimos do novo consignado privado tem surpreendido as ...
O atraso no pagamento dos empréstimos do novo consignado privado tem surpreendido as instituições financeiras. Dados internos da Associação Brasileira dos Bancos (ABBC) apontam que de 10% a 15% do valor que era esperado no primeiro pagamento não foi recebido, segundo o diretor de Crédito Consignado, Alex Gonçalves.
O calote elevado é apontado como uma das explicações para o juro mais alto do que o esperado na modalidade tanto pelo setor financeiro quanto por integrantes da equipe econômica ouvidos sob reserva. De acordo com esses técnicos , parte da inadimplência decorre de problemas no sistema do governo e dificuldades operacionais das empresas, mas que já estão sendo resolvidos.
Por ora, a criação de um teto de juros é tida como improvável, mesmo com a insatisfação de parte do governo com as taxas cobradas pelos bancos.
Lançado em março, o novo consignado para trabalhadores do regime CLT foi pensado para aumentar o acesso de quem tem carteira assinada ao crédito com juros mais baratos do que as modalidades sem garantia. Antes, só podiam contratar o consignado funcionários de empresas que tinham convênio direto com um banco, normalmente as maiores.
A ampliação do público se reverteu em forte aumento das concessões do consignado privado. Já foram concedidos R$ 22,5 bilhões no Crédito do Trabalhador, como foi batizado o programa, até a última segunda-feira, às 17h, com 3,2 milhões de pessoas atendidas.
Alta na taxa de juros
O juro médio cobrado nos empréstimos, por sua vez, aumentou, de 40,9% ao ano em fevereiro (2,9% ao mês), antes da reformulação, para 59,1% em abril (3,95% ao mês), cedendo um pouco até junho, para 56%,3 ao ano (3,9% ao mês), de acordo com estatísticas do Banco Central (BC).
Em relação à inadimplência, os dados do BC mostram queda de fevereiro para junho, de 7,7% para 6,4%, mas Gonçalves argumenta que as estatísticas oficiais ainda não captam completamente o efeito da nova modalidade. Só é contabilizado o atraso maior que 90 dias, enquanto as associadas da ABBC relatam o percentual de calote já na primeira parcela do empréstimo " o que pode ser indício de tendência mais negativa de inadimplência.
Para o diretor da ABBC, o percentual é considerado alto e está relacionado em parte à dificuldade das empresas em cumprir com as obrigações necessárias para o desconto em folha.
A Dataprev, empresa responsável pela parte tecnológica do programa, precisa enviar para os empregadores as informações de créditos tomados por seus colaboradores, processo chamado de conciliação. Depois, precisa lançar essas informações na folha de pagamento dos funcionários (escrituração), para fazer o desconto, e pagar guia com valores dos empréstimos. Os procedimentos não estão funcionando perfeitamente ainda, nem do lado do sistema do governo nem dos empregadores.
Para Gonçalves, o calote acima do esperado se traduz em juros mais elevadas " o que desagrada ao governo.
" O desafio que estamos enfrentando nesses primeiros meses é justamente as empresas compreenderem bem todas as responsabilidades. Realizar a escrituração devida, efetuar o repasse do valor financeiro pela guia do FGTS, para que possa reduzir essa inadimplência de primeira parcela, que de fato ficou um pouco acima daquilo que o mercado esperava " disse Gonçalves.
Interlocutores da equipe econômica admitem que os problemas na escrituração e na cobrança dos empréstimos aumentam um pouco mais o risco de crédito dos bancos, o que se traduz em juros maiores. Segundo fontes, a Dataprev já está trabalhando em uma solução e a perspectiva é que produto fique mais barato, considerando o funcionamento pleno da portabilidade.
Integrantes da equipe econômica ponderam, porém, que o novo modelo está alcançando uma camada da população com vínculos empregatícios mais curtos e com empresas menores, que se traduzem em risco maior do que o de funcionários de grandes companhias. Isso é considerado um sucesso porque permite que essas pessoas tenham acesso a empréstimos com taxas menores do que o crédito pessoal, de 8% a 9% ao mês.
Gonçalves, da ABBC, diz que o aumento das instituições participantes e o início da operação da portabilidade devem reduzir os juros cobrados. Cerca de 80 bancos já estão habilitados, mas apenas 53 estão ativos, segundo dados do Ministério do Trabalho.
Portabilidade travada
O diretor destaca que a portabilidade está travada pela dificuldade operacional de conciliar empréstimos antigos com novos, sobretudo de bancos diferentes. Segundo as regras, por 120 dias, a troca de dívidas entre os bancos só poderia ocorrer se fosse renegociada o débito antigo, seja de crédito pessoal ou do modelo antigo de consignado, em melhores condições para o tomador.
Com isso, os números de portabilidade ainda são muito baixos, atingindo 428 operações em junho, disse o diretor da ABBC. Já a troca de modalidade, de empréstimos pessoais e consignado privado antigo para o novo modelo, dentro de um mesmo banco tem ganhado tração, alcançando 6.523 operações em junho.
O prazo de 120 já foi encerrado e estão previstos ajustes operacionais em 5 de agosto para permitir um processo mais fluido de portabilidade, se for de interesse do cliente.
Gonçalves ressalta que, para a linha ter sucesso, é importante que não tenha teto de juros, como chegou a ser defendido por parte do governo:
" Entendemos que é importante que não haja um teto de juros. Se tiver, fatalmente, vai alijar parte do público.
Nota da Febraban vai na mesma direção: "a definição de um teto de taxa para consignado privado, ainda em fase de amadurecimento, poderá ter um efeito restritivo à oferta do produto".