Domingo, 09 de Noviembre de 2025

Robô que faz serviços domésticos promete ir muito além do aspirador

BrasilO Globo, Brasil 9 de noviembre de 2025

Desde a chegada dos primeiros aspiradores de pó inteligentes, a visão de um futuro como o ...

Desde a chegada dos primeiros aspiradores de pó inteligentes, a visão de um futuro como o dos "Jetsons", a família do desenho animado que tinha uma empregada-robô multifuncional, reacendeu no imaginário coletivo. Agora, essa fantasia ganha um novo contorno com o lançamento do Neo, um robô doméstico humanoide de 1,68 metro, desenvolvido pela norueguesa 1X Technologies. Projetado com inteligência artificial (IA) para tarefas como posicionar pratos e copos na lava-louças, dobrar roupas e buscar objetos na geladeira, o Neo parece simbolizar um novo passo na relação dos humanos com as máquinas. No entanto, por trás da aparência futurista e de um preço bem salgado, o Neo ainda está muito aquém da autonomia que a simpática Rosie demonstrava a serviço dos Jetsons na TV.
No ano que vem, quando os primeiros clientes receberão o robô nos EUA " depois de pagarem US$ 20 mil (R$ 107 mil) ou US$ 499 (R$ 2,7 mil) mensais ", ele poderá fazer sozinho algumas tarefas básicas como atender alguém à porta ou levar um copo à pia. Para as mais complexas, ele ainda será totalmente dependente de um operador humano comandando a máquina por controle remoto de um escritório na Califórnia, nos EUA.
Câmeras, sensores e microfones do robô estarão captando os detalhes da casa o tempo todo. Os dados vão ajudá-lo a aprender a se comportar no seu cenário doméstico, desbloqueando novas atividades ao longo do tempo de aprendizado da máquina.
A aposta no formato humanoide, com braços, mãos e postura ereta, persegue a ideia de ter um ajudante digital capaz de fazer tudo o que um humano faz. Além de o mundo estar projetado para seres bípedes, o formato humano permite ao robô alcançar prateleiras e maçanetas " em teoria. O Neo pesa 30 quilos e, por segurança, foi projetado com motores que limitam força e velocidade, o que o CEO da 1X Technologies, Bernt Børnich, define como "comprovadamente seguro".
Em vez dos robustos sistemas mecânicos típicos da robótica industrial, o robô doméstico associa motores a tendões artificiais, projetados para reproduzir a função dos músculos humanos, com força e velocidade controladas. Assim, mesmo em caso de queda, o risco de ferimentos é mínimo, segundo a empresa. Por precaução, famílias com crianças pequenas ficarão de fora da fase inicial de testes.
Nas propagandas, a fabricante diz que o robô também foi criado para reconhecer quando alguém fala com ele e, então, responder aos comandos. Ele também pode reconhecer objetos ao seu redor e usar sua "memória" para dar continuidade às conversas. Segundo a empresa, o Neo também pode agendar consultas médicas, definir lembretes sobre aniversários e salvar itens em listas de compras, como uma espécie de assistente virtual de corpo inteiro. No entanto, o desafio real reside na curva de aprendizado necessária para o robô lidar com as variáveis de uma casa.
" Uma casa é infinitamente mais complexa do que uma fábrica ou um armazém. Os objetos mudam de lugar, há crianças, animais, líquidos, degraus, uma infinidade de variáveis que um robô precisa interpretar. Já nas indústrias, tudo é organizado para as máquinas funcionarem. É importante entender que esse tipo de lançamento é mais uma promessa de futuro do que uma realidade " observa Fernando Osório, pesquisador do ICMC-USP e membro do Laboratório de Robótica Móvel.
Na avaliação de João Fabro, professor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e especialista em IA e robôs domésticos, o projeto apresenta grandes avanços sob o aspecto mecânico e eletrônico, mas está longe da autonomia prometida:
" Pesquiso robôs autônomos há mais de dez anos, e a primeira vez que vimos um robô abrir uma porta sozinho foi neste ano, em uma competição na Itália. O desafio é enorme porque não basta o robô se mover. Ele precisa compreender o ambiente, antecipar situações e reagir de forma natural, como nós fazemos sem perceber. No caso do Neo, por enquanto, a única coisa que ele faz autonomamente é não cair.
Privacidade em xeque
A 1X Technologies não esconde que, por enquanto, a maior parte das funções do Neo é supervisionada por um operador que enxerga o ambiente através das lentes do robô, o que levanta questões relacionadas à privacidade dos usuários. O próprio presidente da companhia já reconheceu a complexidade:
" Quem compra o Neo aceita um tipo de contrato social. Sem acesso aos dados dos usuários, não temos como aprimorar o sistema.
Embora a empresa garanta que o cliente pode definir limites de acesso, desfocar rostos e delimitar áreas de exclusão, a coleta de dados para o treinamento da IA que move o Neo é a chave do negócio. Na prática, o sistema absorve vídeos gravados nas casas dos usuários e usa essas informações para construir o modelo do mundo real. Essa base de dados ensina o robô a identificar objetos, compreender rotinas e contextos variados. Enquanto sistemas de IA como o do ChatGPT se apoiam em vastos volumes de texto extraídos da internet, o robô aprende pela interação com o ambiente físico.
Para o sociólogo Sérgio Amadeu da Silveira, do Comitê Científico de Pesquisadores em Cibercultura (ABCiber), essa lógica reproduz fisicamente o que já é praticado pelas redes sociais:
" Ao levar câmeras, sensores e microfones para dentro das casas, o robô amplia o poder de conhecimento das empresas de tecnologia sobre a vida íntima dos usuários, entregando a elas detalhes do cotidiano, hábitos e padrões de consumo que podem ser usados para moldar comportamentos e decisões. O que existe, na prática, é a replicação automatizada de tarefas simples, ancorada em um modelo econômico de coleta massiva de dados. Em resumo, o problema não é o robô, é quem controla o robô.
O alerta é endossado por Fabro, da UTFPR, lembrando que os primeiros robôs aspiradores que tinham câmeras acabaram filmando pessoas no banheiro, e essas imagens vazaram.
" É fundamental que existam mecanismos proativos para proteger a privacidade, como anonimizar os dados e filtrar situações íntimas. Não dá para simplesmente acreditar que o fabricante vai resolver isso por nós " diz o pesquisador.
IA fora das telas
A 1X Technologies projeta que, até o fim de 2026, o humanoide estará apto a executar a maioria das atividades domésticas sem a necessidade de supervisão humana constante. Contudo, o CEO antecipa que a performance do robô pode ser inconstante, classificando essa imperfeição como um "slop robótico", um termo que remete à natureza rudimentar e ao estágio inicial de amadurecimento da inovação.
O controle e a programação das atividades do Neo ficarão a cargo de um aplicativo dedicado. Por meio dele, os proprietários poderão agendar as tarefas mais complexas para horários específicos em que os teleoperadores assumirão o controle. A 1X Technologies garante que os humanos que controlam o robô remotamente passam por checagem de antecedentes e são submetidos a monitoramento contínuo.
A chegada de máquinas inteligentes e interativas como o Neo no espaço doméstico representa o cruzamento de uma fronteira tecnológica que está em ascensão: a IA física. Esta evolução representa o momento em que a inteligência artificial, que antes era puramente digital, ganha a capacidade de agir e interagir diretamente com o ambiente, deixando de ser apenas um software para se tornar um agente com presença real. Seu grande diferencial é a capacidade de perceber, raciocinar e executar tarefas complexas em ambientes dinâmicos, tudo que o Neo promete fazer, no futuro.
" A IA física é justamente quando uma máquina passa a ser capaz de mover coisas, esbarrar em objetos e interagir com pessoas. Aí entra a complexidade: o robô precisa perceber o ambiente, tomar decisões em tempo real e agir em sequência, tudo isso com sensores que captam o mundo de forma imperfeita. É o desafio de colocar uma IA que até então só gerava texto e imagens para lidar com gravidade, atrito, desequilíbrio e energia limitada " afirma Marco Aurélio Wehrmeister, especialista em robótica e também professor da UTFPR.
Para ele, a 1X Technologies tem um propósito que transcende o produto final:
" A empresa sabe que está vendendo uma plataforma de coleta de dados, não um produto acabado. É parecido com o que aconteceu com o primeiro iPhone ou com os primeiros carros autônomos: o custo inicial era altíssimo, mas o objetivo era aprender com o uso. O Neo vai cumprir esse papel: reunir dados e permitir o aprimoramento dos modelos de IA física que virão depois.
La Nación Argentina O Globo Brasil El Mercurio Chile
El Tiempo Colombia La Nación Costa Rica La Prensa Gráfica El Salvador
El Universal México El Comercio Perú El Nuevo Dia Puerto Rico
Listin Diario República
Dominicana
El País Uruguay El Nacional Venezuela